Maranhão ancestral no julho das pretas

Por Flávia Regina Melo/Buliçoso – O Brasil possui 58 milhões de mulheres negras. Registra-se o assassinato de dois terços delas. No Maranhão, segundo um estudo realizado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) em parceria com o Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP), a cada 38 mortes no estado do Maranhão 4 são de mulheres negras. Em 2017, para cada 1 mulher não-negra assassinada, 8 mulheres negras foram mortas. Em números gerais, das 127 mulheres vítimas de homicídio, 113 eram negras. Os problemas variam de homicídios a violência sexual, ausência de políticas públicas de saúde ou estímulo à geração de emprego e renda a mulheres negras que vivem nas favelas, nos quilombos urbanos e rurais, nas florestas e nos territórios das águas.

Os debates sobre o assunto ganharam relevo e merecem mais do que uma data comemorativa, o Dia Internacional da Mulher Negra, Latino-Americanda e Afrocaribenha, hoje, 25 de julho. A Articulação das Mulheres Negras do Maranhão e militância estão realizando uma série de atividade relacionadas a um mês inteiro de manifestações e realizações: o Julho das Pretas. Este ano, a Rede de Mulheres Negras do Nordeste traz como tema Mulheres Negras por um Nordeste Livre. A pauta é tão atual quanto urgente. Mulheres, negros e negras e nordestinos jamais foram tão achincalhados por um presidente da República na história do Brasil.

A inquestionável presença negra na nossa formação evidencia-se em diversos aspectos, culturais, econômicos, literários e históricos. O Maranhão foi o quarto estado brasileiro a receber o maior número de escravos e a última província a abolir a escravidão. De Catarina Mina e Maria Firmina dos Reis, hoje reconhecida nacionalmente como a primeira romancista abolicionista do país, as mulheres negras maranhenses destacam-se após séculos de invisibilidade por parte da historiografia oficial.

Reparação – Pode parecer intrigante que um estado com um infinidade de elementos da cultura africana, tambores, danças, de rituais de origem africana, com uma capital conhecida por Jamaica brasileira, ainda ostente tantos indicadores perversos relacionados à população negra. Em um recorte relacionado apenas à questão da violência, um levantamento do Atlas da Violência 2019 mostra que negros e negras são as maiores vítimas da violência no estado. A cada 100 pessoas assassinadas no Maranhão, 91 são negras. O estudo aponta que, de 2007 a 2017, enquanto o número de mulheres não-negras assassinadas diminuiu em 7,7% no estado, o de mulheres negras disparou para além de seu dobro, em 126%. O racismo seria uma explicação, porém superficial. Negros e, sobretudo, negras, são herdeiros de séculos de exploração e humilhação. Não há como ignorar que o maior conjunto arquitetônico de origem portuguesa da América Latina foi erguido com o sangue e o suor negros. O poder público tem obrigação de ressarcir e reparar o povo negro.

Esse Maranhão ainda  escondido debaixo das saias das pretas, precisa levantar e mostrar a que veio.


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