Cinco pontos que escancaram o esvaziamento da política ambiental no Brasil

Publicado no Brasil de Fato

Área sofreu reveses mesmo antes do início do novo governo; mudanças na pasta são criticadas por ambientalistas

A questão ambiental foi o centro de polêmicas antes mesmo do governo Jair Bolsonaro (PSL) começar em 2019: depois de eleito em outubro de 2018, o novo presidente anunciara a intenção de extinguir o Ministério do Meio Ambiente (MMA). Por conta das críticas, recuou da iniciativa.

A mudança, entretanto, não faz com que entidades ambientalistas poupem críticas à política ambiental de Bolsonaro e do ministro Ricardo Salles.

“O governo não tem uma política ambiental. O governo tem uma estratégia de esvaziar a política ambiental. Como ele teve de recuar na extinção do Ministério, a pasta virou o principal operador da estratégia de esvaziamento. Estamos vendo a anti-política”, diz Adriana Ramos, coordenadora do programa de politicas e direitos socioambientais do Instituto Socioambiental (ISA).

Abaixo, o Brasil de Fato lista cinco questões que sofreram retrocessos ou estão sob ameaça por conta da política de Bolsonaro para o setor.

1. Enfraquecimento institucional

Apesar de mantido, o MMA perdeu parte de suas competências. O Serviço Florestal Brasileiro, responsável pela gestão das Florestas Nacionais, passou para o Ministério da Agricultura; já a Agência Nacional das Águas foi para o Desenvolvimento Regional.

Além disso, segundo Adriana Ramos, do ISA, há questões específicas sob a alçada do Meio Ambiente em que há dúvida sobre o departamento responsável, além de setores ainda sem nomeações.

“Toda política [ambiental brasileira] está ameaçada. O Ministério começa por esvaziar os fundamentos da política ambiental: a participação social e o acesso a informação. São duas coisas ameaçadas, a partir daí, todo o resto fica ameaçado”, complementa ela.

O esvaziamento da política ambiental – inclusive com o Ibama anunciando previamente em que local realizará fiscalizações – já mostra seus efeitos: a quantidade de multas aplicadas pelo órgão de janeiro a maio foi o menor dos últimos 11 anos, com queda de 34% em relação ao ano passado.

2. Fundo Amazônia

Salles questionou o modo de gestão do Fundo Amazônia, financiado principalmente pela Noruega e Alemanha. A proposta de mudança causou, inclusive, um constrangimento diplomático e pode colocar em xeque a continuidade do instrumento. Um dos argumentos mais mobilizados pelo ministro é justamente o da falta de orçamento para a pasta.

O Fundo foi criado em 2008, recebendo repasses anuais dos dois países. Hoje, tem cerca de R$ 3 bilhões. Ainda em 2018, a Noruega anunciou que reduziria em 50% os repasses por conta do aumento da devastação amazônica durante o governo Temer.

“Uma das soluções que vinham sendo utilizada era a utilização o próprio Fundo Amazônia para financiar a fiscalização. O ministro tomou a iniciativa deliberada de paralisar o fundo. O governo se coloca em uma sinuca de bico propositadamente, porque não deseja que o combate ao desmatamento avance”, avalia a diretora do ISA.

3. Reserva legal e Código Florestal

O senador Flávio Bolsonaro (PSL-RJ) apresentou Projeto de Lei que extingue as chamadas reservas legais – áreas que não podem ser desmatadas no interior de propriedades rurais. Segundo o parlamentar, a medida fere o direito de propriedade.

O governo, de outro lado, já apontou que retomará o conteúdo da Medida Provisória 867, que perdeu a validade. O texto, que beneficiaria apenas 4% dos produtores rurais do Brasil, altera o Código Florestal, estabelecendo, entre outras coisas, uma espécie de anistia que elimina o dever de recomposição de florestas desmatadas.

Esse último ponto é considerado o mais grave pela Greenpeace na proposta retomada pelo Planalto.

“Ampliará a anistia já concedida, que dispensou na aprovação da lei a recuperação de 41 milhões de hectares em todo o país, área maior que a do Mato Grosso do Sul. Sob a falsa alegação de “aprimoramento” da regra, a anistia será ampliada para os grandes produtores rurais, dispensando-os de recuperar algo entre 5 e 6 milhões de hectares, ou duas vezes a área do de Sergipe”, diz texto da organização sobre a MP 867.

“A sinalização política que o presidente e o ministro dão é de estímulo à atuação dos grupos que se beneficiam do desmatamento ilegal. Pode-se não ter dinheiro, mas se sinalizar politicamente com o interesse de fazer algo mesmo com dificuldades. Não é o que estamos vendo: o governo não tem dinheiro, mas também não tem um discurso político de fortalecimento”, comenta Ramos.

4. Revisão de Unidades de Conservação

Salles já anunciou a intenção de revisar todas as Unidades de Conservação, desde o Parque Nacional de Itatiaia (de 1934) até o Refúgio da Vida Silvestre da Ararinha Azul (estabelecido em 2018). Ao todo, são 334 unidades. Segundo o ministro, elas foram criadas “sem critério técnico”.

5. Política climática

O governo Bolsonaro abriu mão de sediar a COP-25, maior encontro climático do mundo, que agora irá ocorrer no Chile, em novembro. Salles afirma constantemente que o tema “não é prioritário”. O ministro chegou a anunciar também a não realização Semana do Clima da América Latina e Caribe em Salvador (BA). Pela intervenção do prefeito da cidade, houve recuo no anúncio.

“A recusa do governo em receber a Semana do Clima demonstra ainda o negligenciamento do governo quanto a enfrentar de fato esse desafio”, criticou o Greenpeace em relação ao anúncio original.

Além disso, 95% das verbas para a área foram cortadas.

Edição: Aline Carrijo


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