Tragédia anunciada no Maranhão

Foto de Ana Mendes

[Por Emilio Azevedo*] A comunidade Tremembé do Engenho, localizada no município maranhense de São José de Ribamar, está ameaçada de despejo. São mais de sessenta famílias, com mais de trezentas pessoas, entre crianças, idosos e mulheres grávidas. Na terra existem hortas, roças e criações de animais. A área tem 86 hectares. A pressão pelo despejo parte de estranhas decisões da Justiça estadual e da permanente ameaça de jagunços.

Segundo texto divulgado na quarta (15/08), pelo Conselho Indigenista Missionário (CIMI), as decisões judiciais são “abusivas e ilegais”. Quanto aos jagunços, eles estariam a serviço do ex-deputado estadual pelo PSDB Alberto Franco, a figura que se movimenta para tomar e expulsar o povo da terra.

Este mesmo Alberto Franco já foi acusado textualmente, pelo Ministério Público estadual, de “fazer parte de uma quadrilha” ligada à “grilagem de terras”. Ele também foi dono de um cartório no mesmo município de São José de Ribamar e ocupou cargo de secretário de Estado no último governo de Roseana Sarney. Estranhamente, a justiça do Maranhão negou, por onze vezes (onze vezes!), a realização de perícia nos documentos apresentados pelo suposto proprietário. Os pedidos de perícia partiram do Ministério Público, da Defensoria Pública e de organizações sociais.

O último incidente com jagunços ocorreu no início desta semana, dia 14 de agosto, quando três homens armados ameaçaram a comunidade. Houve reação e o trio foi expulso. O ambiente, no entanto, segue bastante tenso. Há receio de um novo ataque. Além disso, recentes decisões judiciais (insensíveis e injustificáveis!) que falam em despejo. Diante do quadro, o conflito na comunidade Tremembé do Engenho tende a se acirrar.

“Espero que o governador Flávio Dino não coloque a Polícia Militar a serviço de grileiros de terra!” Essa declaração dada na manhã da quarta (15/08), para nossa reportagem, é de uma das lideranças do Engenho, que garante estar “ameaçada de morte”. Essa mesma liderança espera “que a Justiça observe as fraudes evidentes promovidas por Alberto Franco e garanta a terra da nossa comunidade”.

O Engenho não está só!

Para que o leitor tenha uma ideia da ousadia dos que agem contra a comunidade Tremembé do Engenho, em fevereiro deste ano, o desembargador Raimundo Nonato Magalhães Melo, do Tribunal de Justiça do Maranhão, visitou a comunidade e também foi intimidado por jagunços.

Segundo informou o próprio desembargador, quando ele esteve lá “surgiram três ou quatro carros” que eram ocupados “por seguranças, com o objetivo de assustá-lo”, além de “estourar fogos de artifícios para, muito provavelmente, denunciar a presença” do magistrado.

Magalhães Melo tomou decisão em favor da comunidade, suspendendo a possibilidade de despejo. O problema é que ele atuou no caso como substituto. O titular é o desembargador Raimundo José Barros de Sousa, que já foi denunciando para o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e tem sua atuação considerada “suspeita e abusiva”.

E ainda na quarta, diante do novo ataque ao território Tremembé do Engenho, uma vigília foi iniciada na comunidade. Nessa atividade o povo canta, faz orações, rituais e promove a guarda do território. A vigília conta com o apoio da Teia de Povos e Comunidades Tradicionais do Maranhão, além de pastorais sociais e organizações de apoio a indígenas, quilombolas e quebradeiras de coco.

O acirramento desse conflito em São José de Ribamar, cidade que fica ao lado de São Luís, a capital do Maranhão, ocorre na mesma semana em que foi assassinado o cacique Jorge Guajajara. Este crime ocorreu no município de Arame, na Amazônia maranhense, região onde existem vários conflitos de indígenas contra madeireiros, associados a políticos locais. Segundo dados da Comissão Pastoral da Terra (CPT), o Maranhão foi, em 2017, o estado brasileiro com maior número de conflitos no campo. A luta de muitos agora é para que a comunidade Tremembé do Engenho não engrosse a lista de tragédias.

*Emilio Azevedo é do Jornal Vias de Fato (MA) e colaborador do Núcleo Piratininga de Comunicação (NPC).


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