Tradição quilombola, preservação e troca de sementes é resgatada em Castro (PR)
Mais de 15 comunidades já confirmaram presença na atividade que acontece no próximo dia 21 de julho.
“Quem planta um prato colhe um saco”. Um ditado popular que circula entre comunidades revela muito de uma prática bastante comum entre quilombolas: a da preservação de sementes crioulas. O costume de selecionar as melhores sementes e as guardar para os próximos anos é repassado entre as diferentes gerações nos quilombos há anos. Agora, essa prática será ampliada em um movimento de troca que envolve comunidades de todo o estado do Paraná, na Festa Estadual de Sementes e Mudas Quilombolas. A agenda inicia uma sequência de feiras no estado de diálogo com temas da biodiversidade (veja abaixo).
Organizada pela Federação Estadual das Comunidades Quilombolas (Fecoqui) em parceria com a Rede de Sementes da Agroecologia (Resa) e a Terra de Direitos, a atividade acontece no próximo dia 21 de julho na cidade de Castro, município localizado na região dos Campos Gerais. Mais de 15 comunidades de ao menos nove cidades do Paraná já confirmaram presença no evento.
Na programação, atividades diversas: culinária quilombola, espaços de saúde e bem-viver, oficinas como de tranças e turbantes e de bonecas de pano, e atrações culturais. Já estão confirmadas apresentações de dança do grupo de mulheres do Quilombo Família Xavier, da cidade de Arapoti, e também de um grupo do Quilombo Paiol de Telha, de Reserva do Iguaçu.
Presidente das Comunidades Negras Rurais de Castro e uma das organizadoras da Festa, Rozilda Cardoso explica que a proposta da agenda é que quilombolas de todo estado possam compartilhar diferentes experiências e produtos. Além das sementes crioulas, as pessoas são convidadas a levarem mudas de plantas, chás medicinais, alimentos produzidos no quilombo e outras produções próprias, como artesanato.
Segundo ela, a principal coisa a ser trocada na Festa é o conhecimento. “O que você sabe fazer também é uma semente. Então você pode aprender como plantar, como cultivar ou como fazer outras coisas”, explica.
Secretária operativa da Fecoqui, Isabela Cruz também destaca a necessidade de valorização do conhecimento tradicional. “A ideia é justamente contrapor esse discurso de que não se faz ciência, não se tem conhecimento, não se produz no campo. Pelo contrário, o que a gente vê no campo nas comunidades quilombolas é uma imensa riqueza que não é valorizada”, sublinha.
Luta pela terra
Isabela destaca que a Festa é também uma maneira de resgatar práticas e culturas tradicionais que estão se perdendo – inclusive a de preservação e guarda das sementes crioulas. “As comunidades infelizmente estão perdendo as sementes porque estão perdendo território de planta. Se você não tem onde plantar, não vai fazer seu estoque de sementes”, explica.
O Paraná possui 38 comunidades quilombolas certificadas pela Fundação Cultural Palmares, mas, até agora, apenas o Quilombo Paiol de Telha foi parcialmente titulado pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) – a comunidade possui o título de apenas 10% do território reconhecido e a que tem direito.
Enquanto as comunidades quilombolas não são tituladas, as famílias sofrem com a expropriação de suas terras ou com a falta de garantias para poderem permanecer nos territórios tradicionais.
Na cidade de Castro, onde será realizada a Festa, foram certificadas quatro comunidades quilombolas: Mamãs, Serra do Apon, Limitão e Comunidade do Tronco. Somados, há mais de 120 famílias morando nos quilombos da cidade. Mas Rozilda destaca que há muitas famílias vivendo em outras regiões da cidade, fora dos territórios. “Tem muitas famílias vivendo também em periferias ou até em situação de miséria”.
Agora, por meio da Festa, as comunidades pretendem avançar nos debates relacionados ao território, alimentação saudável, soberania alimentar, entre outros. Além disso, poderão trocar com diferentes quilombos variedades de sementes e plantas que já não possuem mais. Junto com isso, a proposta é de que quilombolas pensem coletivamente formas de enfrentamento e resistência para a preservação de seus territórios. “A ideia é que nessa troca a gente possa replantar não só as sementes, as mudas e as ramas, mas também replantar a ideia de luta do campo”, lembra Isabela.
Agendas:
As festas de semente já são uma tradição em diferentes cidades Paraná. Confira os locais onde acontecerão os próximo eventos:
Dia 11 de julho – Boa Esperança do Iguaçu
16ª Festa Regional das Sementes
Dia 27 de julho –Ponta Grossa
11ª Celebração da Vida
Dia 9 de agosto – Tomazina
07ª Festa de Sementes Crioulas Indígenas Ymau na Terra Indígena Pinhalzinho
Dia 16 e 17 de agosto – Rebouças
17ª Festa Regional de Sementes Crioulas
Dia 17 de agosto – Vale do Ribeira
12ª Festa de Sementes dos Quilombolas
Dia 25 de agosto – Pinhais
Festa das Sementes
Dia 29 de agosto a 1 de setembro – Curitiba
18ª Jornada de Agroecologia
Dia 31 de agosto – Ortigueira
Festa das Sementes
Dia 7 de setembro – Guaraqueçaba
Festa das Sementes
Dia 14 de setembro – Mandirituba
Festa das Sementes
Dia 21 de setembro – Castro
2ª Feira de Sementes Crioulas
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