Teia de Povos e Comunidades Tradicionais do MA denuncia empresas durante 8ª edição do Encontrão

Teia aponta o nome de empresas com empreendimentos, sejam eles em parceria com o governo do Maranhão ou o governo federal, que avançam sobre territórios tradicionais

Por Ana Mendes, colaboração para o CIMI Regional Maranhão

Itahu Ka’apor denuncia invasões à Terra Indígena Alto Turiaçu durante Encontrão da Teia. Foto: Ana Mendes

 

 

 

 

 

 

 

 

 

O 8º Encontrão da Teia de Povos e Comunidades Tradicionais do Maranhão aconteceu na comunidade sertaneja Gostoso, município de Aldeias Altas. Sob o lema Retomar Nossas Raízes com Luta e Resistência, Defendendo a Vida e o Bem Viver cerca de 400 lideranças vindas da região da Baixada Maranhense, dos Cocais, do Sul e do Norte reuniram-se durante três dias para debater temas relativo às ameaças sofridas por comunidades que estão em luta por território. Diferentes contextos, mas com denominadores em comum se evidenciam quando o assunto é a terra. A carta pública lançada ao término desta edição do Encontrão, que acontece duas vezes ao ano, aponta o nome de empresas com empreendimentos privados ou público-privados, sejam eles em parceria com o governo do Maranhão ou o governo federal, que estão avançando sobre territórios tradicionais e originários.

Algumas delas ganham destaque, caso da WPR Gestão de Portos e Terminais Ltda que aos poucos está expulsando os moradores da comunidade pesqueira Cajueiro, na capital São Luís, para a construção de um retroporto. As obras contaram com licenças questionáveis expedidas pela Secretaria de Meio Ambiente para instalar o projeto na área de uma Reserva Extrativista, em vias de ser decretada. A Vale também é citada, pois impacta as comunidades por onde passa a Estrada de Ferro Carajás (EFC). A ferrovia que rasga o estado, vinda do Pará, a partir da cidade de Açailândia, seguindo até a ilha de São Luís, além de tirar o direito de circular livremente das comunidades provoca a mais triste das perdas, a da vida. O trem da Vale matou, de 2010 pra cá, 39 pessoas. Em 2017, foram 7 mortes.

“Eu nasci sem terra e vou lutar por terra, não tenho vergonha de dizer o que eu sou. Não adianta querer ser rico, porque eu não sou rico. Não adianta dizer que eu sou filho de proprietário que eu não sou. Eu nasci e me criei na escravidão”

“O momento é muito importante. Nós sabemos o que era antes desses encontros, cada um lutando por si. Era bom, mas de fato precisava de uma organização pra gente se ver. Pra ver a quantidade de conflitos que existem no Maranhão. Para ver também as lutas e as vitórias. O Maranhão quando está nos meios de comunicação só aparece com coisa que não presta. Mas nosso sonho não está longe, ele está bem pertinho. Precisamos é de mais solidariedade da sociedade envolvente.”, ressalta Dom Sebastião Duarte, da Diocese de Caxias.

A empresa Costa Pinto, que começou suas atividades no Maranhão nos anos 70, é hoje dona de mais de 70 mil hectares, entre a cidades de Codó, Caxias, Aldeias Altas e Afonso Cunha. Realiza uma brutal especulação imobiliária com base no agronegócio. Muitos dos moradores de Gostoso, onde aconteceu essa oitava edição do Encontrão, já foram vítimas de despejos provocados pelos negócios da empresa e agora vivem mais uma vez pressões sob a atual área, onde moram cerca de 37 famílias.

“Eu nasci sem terra e vou lutar por terra, não tenho vergonha de dizer o que eu sou. Não adianta querer ser rico, porque eu não sou rico. Não adianta dizer que eu sou filho de proprietário que eu não sou. Eu nasci e me criei na escravidão”, afirma uma das lideranças da comunidade, fazendo alusão a uma denúncia contra a empresa TG, arrendatária da Costa Pinto, que em 2007 foi denunciada pela morte de um trabalhador.

Povo Akroá-Gamella realiza ritual durante Encontrão da Teia. Foto: Ana Mendes

A Teia e a resistência dos povos

O ano de 2018 marca o sétimo ano de existência da Teia do Maranhão, que tem como base a luta pela manutenção dos princípios do Bem Viver, soberania alimentar e a preservação das mais diversas práticas culturais, que se manifestam de maneira ancestral. Nesta edição destacou-se também a questão da autoproteção levando em conta os dados recentes que apontam para um aumento substancial no número de pessoas ameaçadas no estado, colocando-o em primeira no ranking do país. Segundo o Caderno de Conflitos no Campo da Comissão Pastoral da Terra (CPT), lançado esse ano com dados de 2017 o Maranhão contabilizou 101 ameaçados. A morosidade do estado em solucionar os conflitos e proteger as comunidades faz com que as famílias criem suas próprias formas.

Um dos grandes exemplos é o povo indígena Ka’apor que faz ações contra a extração ilegal de madeira, fiscalizando 500 mil hectares de extensão no noroeste do Maranhão, na Terra Indígena Alto Turiaçu. “Todos os parentes aqui do Maranhão estão nessa mesma situação que a nossa. Estão com os territórios sendo cobiçados. Mas nós estamos fazendo o monitoramento do nosso território, o avivamento dos limites do nosso território. É muito complicado porque o estado do Maranhão está perseguindo o nosso Conselho. Todo mundo sabe que o papel do governo é destruir nossa floresta, nossa saúde e nossa educação. É isso que eles querem, mas nossa força é maior do que eles. Nós temos que estar unidos junto com a nossa floresta.” conta Itahu Ka’apor.

Mais da metade dos participantes do Encontrão da Teia era composta por mulheres: “não há territórios livre com corpos presos!”. Foto: Ana Mendes

Dos cerca de 400 participantes do Encontrão, quase a metade estava representada por mulheres. Levando em consideração o protagonismo do gênero feminino na luta pela terra, o debate sobre os papéis sociais engendrados pela mulher no contexto de vida comunitária e da política tem sido pleiteado por quilombolas, indígenas, quebradeiras de coco, pescadoras, camponesas e sertanejas. “Não há territórios livres com corpos presos!”, afirmaram elas em uníssono, exigindo maior reconhecimento de suas questões e anseios, por parte dos companheiros. “Através desse movimento a gente quer puxar outras mulheres pra não ter medo de falar. Na nossa cultura tem algumas aldeias que ainda tem a tradição de não deixar as mulheres participar, sentar junto com os homens, discutir, trocar ideia, então a gente fala nesses movimentos que nós também temos esse direito, de estar discutindo não precisa ter medo.”, conta Marli Krikati, coordenadora da Articulação das Mulheres Indígenas do Maranhão (AMIMA).

Fonte: Cimi Regional Maranhão


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