Gênero e raça são divisões estruturantes impostas pelo capitalismo na luta de classes
Racismo, machismo e LGBTfobia são temas que devem ser reiteradamente abordados pelo movimento sindical em seus espaços de comunicação
“Combater o racismo não é tarefa exclusiva da população negra. Combater o machismo não é tarefa exclusiva das mulheres. Combater a LGBTfobia não deve ser tarefa exclusiva da população LGBT”. É assim que Ângela Guimarães, presidenta da União de Negros pela Igualdade (UNEGRO), convoca o movimento sindical a pensar as pautas historicamente interditadas pelas diversas narrativas de comunicação e é dessa forma que uma mesa formada por quatro mulheres negras e feministas debateu a inserção das temáticas de gênero, raça e dos movimentos sociais nos materiais dos sindicatos.
Formada ainda pela jornalista Cleidiana Ramos, doutora em Antropologia pela UFBA, e pela socióloga Vilma Reis, que é chefe da ouvidoria da Defensoria Pública da Bahia, e mediada pela jornalista Marcia Ferreira, a mesa “Como trabalhar a comunicação de gênero, raça e movimentos populares no movimento sindical” iniciou os debates na manhã do segundo dia do 6º Seminário Unificado de Imprensa Sindical nesta sexta-feira, 01 de junho, em Salvador.
Cleidiana iniciou sua abordagem alertando que no Brasil falta debate sobre gênero e raça, nas palavras de Vilma, debates interditados, junto ao da sexualidade, num contexto em que 54% da população do país é de negros e 52% mulheres. Em Salvador, a população negra é de 80%. Esses dados gerais sobre a população desembocam na realidade das direções sindicais. “Onde estão as mulheres negras na política sindical?”, questiona Cleidiana. Para ela, as entidades reproduzem o racismo estruturante de toda a sociedade.
E como o movimento sindical pode dialogar gênero e raça em seus materiais? Para Vilma Reis, mulher negra, feminista, de esquerda, anticapitalista e com visão de mundo internacionalista, o jornalismo sindical assume papel decisivo para enfrentar essa linha de guerra no país, que, com a destruição da justiçado do trabalho pela reforma trabalhista, o enfrentamento deve partir primeiro da comunicação com uma disputa de narrativa fora das cortes contra os ataques “organizados pela narcoparlamento formado por exploradores de trabalhadores”, contextualizou, referindo-se aos deputados que forjaram o golpe.
Vilma contextualizou sua fala sobre o racismo sob o ponto de partida da quantidade de trabalhadoras domésticas, 8 milhões de pessoas no país, e da responsabilidade do jornalismo no segmento do serviço público, em que a política de cotas é sistematicamente atacada pela narrativa hegemônica. Exercendo um cargo de representatividade e se reafirmando como a primeira geração de sua família com acesso ao ensino superior, a socióloga falou sobre a importância do povo negro, das mulheres negras, comemorarem cada formatura e levarem seus familiares para essas comemorações, sobre o impulsionamento da esquerda, em que é a “cara preta de posição política definida que empurra a esquerda para a esquerda”, e propõe uma pedagogia da desobediência enquanto resistência.
Ângela puxou o debate para a abordagem contra os silenciamentos históricos a que o povo negro é submetido nas narrativas oficiais, disse que o movimento sindical não pode considerar que o mundo do trabalho começa com a falsa abolição, pois desconsidera os 400 anos de escravismo desde a invasão do Brasil, a subjugação dos povos tradicionais e os primeiros sequestros dos povos africanos. Ela situou que desde esse momento também existe greve e resistência do povo negro, que a primeira greve de trabalhadores não foi em 1917, mas quando o povo negro escravizado parou um porto, formou quilombos, liderou exércitos de resistência.
“Nesse campo da comunicação sindical e contra-hegemônica temos que promover o estranhamento diária, não a naturalização”. Ela deixa claro que não fala sob a perspectiva das identidades e sim apoiada no marxismo, em que o capitalismo se utiliza do racismo para se desenvolver. “O capitalismo não nos trata como iguais na luta de classes. Homens brancos e negros, mulheres e negras, nós não somos iguais para o capitalismo”, explica.
Diversos outros aspectos sobre o racismo e a misoginia foram abordados no debate, que não se esgota, mas que deve pautar a narrativa do movimento sindical como estruturante e transversal na luta de classes, considerando todas as ferramentas disponíveis para essa disputa de narrativas. “A revolução será negra, feminista e LGBT ou não será”, reafirmou Ângela.
Por Paula Zarth Padilha, do Terra Sem Males
Para a FETEC-CUT-PR
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