Exposição propõe solidariedade entre campo e cidade
Por Emilio Azevedo*
Uma exposição fotográfica para aproximar as periferias urbanas de um cotidiano de resistência vivido por povos e comunidades tradicionais, especialmente indígenas e quilombolas. Esta é a proposta do fotógrafo Hernando Cunha. E é com esse firme propósito que, entre os dias 26 de setembro e 11 de outubro, ele está expondo 20 fotos de sua autoria no Centro de Criatividade Odilo Costa Filho, no bairro da Praia Grande, no Centro histórico da cidade de São Luís do Maranhão.
Fotos: Hernando Cunha
Hernando é morador do Coroadinho, uma das comunidades pobres mais estigmatizadas da periferia de São Luis. Além de fotógrafo, ele faz vídeos e é militante do grupo de hip hop Quilombo Urbano, movimento que desenvolve um trabalho de pedagogia popular. Nos últimos anos, ele tem acompanhado as ações de organizações sociais que hoje se articulam na Teia de Povo de Povos e Comunidades Tradicionais do Maranhão.
Em relação à vida de quilombolas e indígenas, a exposição trata desde conflitos, ocupações de terras e manifestações públicas, até festas, tambores, pescarias, pinturas corporais, confecção de arco e flecha. As fotos têm um tamanho de 60 por 40 cm. Em uma delas pode ser vista um criança deitada em uma rede, num momento de paz em sua comunidade. Em outra imagem aparece um grupo de indígenas num protesto feito na capital maranhense.
Fotos: Hernando Cunha
Periferias e povos tradicionais: a mesma dor “Os problemas que nós vivemos nas periferias das grandes cidades têm relação direta com os dramas enfrentados por povos e comunidades tradicionais”, diz Hernando, explicando que a aproximação que ele pretende fazer com sua exposição “é para estimular a solidariedade”. Ele lembra que “a violência é muito grande. E a sociedade precisa conhecer e se reconhecer nesses problemas. Pra mim essa é uma das minhas funções enquanto profissional da comunicação”.
Hernando acompanhou a retomada da terra feita em 2016 pelos indígenas do povo Gamela. Essa ação tem grande simbolismo político, pois os Gamela eram tidos por muitos como um povo extinto. Além disso, a ousadia dessa ocupação pode ser melhor entendida quando se sabe que a área retomada estava sob a posse de uma juíza, outra parte de um empresário e uma terceira de um ex-prefeito de uma cidade da região.
Um ano depois, em maio de 2017, Hernando voltou ao território Gamela logo após o massacre promovido contra esse povo. O ataque deixou 13 indígenas feridos e ganhou repercussão internacional. Entre os atingidos cinco foram baleados (sendo que um deles levou um tiro na cabeça e sobreviveu) e dois tiveram as mãos decepadas. Ao chegar ao território, horas depois do grave incidente, acompanhado de militantes de diferentes organizações sociais, Hernando se concentrou em fotografar expressões que segundo ele revelavam “indignação, medo, resistência e disposição para luta”.
A exposição trata de um dos problemas centrais do Maranhão e também do Brasil.
A luta do Moquibom
Hoje, no Maranhão, há mais de 400 comunidades quilombolas com pedido de titulação de terra no Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA).
Esses números vieram a tona recentemente, quando entre os dias 17 e 21 de setembro, várias comunidades do Maranhão, ligadas ao Movimento dos Quilombolas do Maranhão (Moquibom), estiveram acampadas na sede regional do órgão, em São Luís, cobrando a titulação de 72 territórios, prometida num acordo feito entre o Incra e o Moquibom, ainda em 2015, quando o movimento ocupou este mesmo prédio. Hernando acompanha quase todos os protestos que tem sido feitos, em São Luís, pelo Movimento dos Quilombolas do Maranhão (Moquibom).
Este trabalho feito cotidianamente não lhe garante uma grande renda. Para fazer essa exposição, por exemplo, cada foto lhe custou R$ 38,00 para impressão, somando um custo total de R$ 760,00 (setecentos e sessenta reais). Para ele, isso é caro. E para conseguir expor o seu trabalho, ele contou com o apoio do Sindicato dos Bancários e da CSP Conlutas. Apesar das grandes dificuldades, este subversivo brasileiro diz que “sonha com um livro que possa registrar esses momentos de vivência e resistência”, tudo isso “para estimular a solidariedade entre campo e cidade”.
*Emilio Azevedo é do Jornal Vias de Fato (MA), da Rádio Tambor e colaborador do Núcleo Piratininga de Comunicação (NPC).
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