Mais de 15 mil pessoas se reuniram na Praça Santos Andrade, em Curitiba, em defesa da candidatura de Lula, contra o fascismo e em defesa da democracia.
Após atentado, Curitiba é palco de ato suprapartidário de Lula, Boulos e Manuela
Por Paula Zarth Padilha, do Terra Sem Males
A Caravana Lula pelo Brasil na região sul do país estava marcada para terminar no final da tarde desta quarta-feira, 28 de março, em Curitiba. Mas a agenda partidária se transformou no início de uma ofensiva unitária dos partidos de esquerda para o combate ao fascismo e em defesa da democracia.
O atentado a tiros contra dois ônibus da caravana de Lula ocorrido na estrada, à luz do dia anterior, no trecho entre Quedas do Iguaçu e Laranjeiras do Sul foi o disparador desse evento político contra a violência que reuniu no mesmo palco os três pré-candidatos de esquerda Lula (PT), Guilherme Boulos (PSol) e Manuela D’Ávila (PC do B).
Mais de 15 mil pessoas acompanharam o ato, que começou e terminou com chuva forte, e teve ainda a participação da bancada do Partido dos Trabalhadores de várias regiões do país, como Fernando Haddad, Benedita da Silva, Lindberg Farias, Paulo Pimenta.
Benedita da Silva foi a primeira a falar numa grande frente de esquerda. Para ela, o tiro foi na esperança, na democracia.
“Estamos aqui pra dizer que não temos medo, que não vão nos calar, não vão nos intimidar”. Grande parte das lideranças do PT no Paraná estavam presentes como a Senadora Gleisi Hoffmann, a vereadora Professora Josete, os deputados Estaduais Tadeu Veneri e Professor Lemos, os deputados federais Enio Verri e Zeca Dirceu, o presidente estadual do partido Dr. Rosinha e o presidente em Curitiba, André Machado.
Professora Josete, a única vereadora do PT em Curitiba, falou em resistência e enalteceu que Lula chegou à presidência por um projeto coletivo de nação. Para além dos partidos, representantes das centrais sindicais CUT, Força Paraná e Intersindical, a presença de representantes do MST, da Frente Povo Sem Medo, do MAB, da UJS, do Levante Popular da Juventude.
A presidenta eleita Dilma Rousseff foi a primeira a discursar após a chegada de Lula ao ato. Ela destacou a importância de neste momento a praça estar ocupada pela população em Curitiba.
“Nessa caravana enfrentamos o mais grave fascismo. O meu impeachment semeou o ódio, que construiu a violência”, afirmou. Dilma falou que os tiros são o tipo de política de quem não gosta do diálogo e da democracia. “Como gosta de dizer o grande líder deles, que fala de matar, que fala de tortura”, denunciou. “Muitos querem usar a violência como álibi, nós usamos nossa verdade, nossa capacidade de luta e resistência”.
João Pedro Stédile, coordenador do MST, falou sobre a missão de todos assumirem compromissos: de não deixar que Lula seja preso; de denunciar os golpistas nos muros; de participar do Congresso do Povo. “Cada um aqui tem que andar com um spray nos bolsos e escrever em cada muro: Lula Inocente. Os muros são a nossa Globo”, disse.
“A esquerda tem que fazer o trabalho de base, essa campanha eleitoral não vai ser normal. É luta de classes. Porque estão em disputa dois projetos políticos. Um é o da burguesia. O outro é que estamos construindo com unidade. É uma disputa de ideias”, alertou.
A senadora Gleisi Hoffmann destacou a importância da participação de parlamentares de lugares distantes do país para construir essa unidade de esquerda a partir do ato de encerramento da caravana, como a presença do senador João Capiberibe, do PSB, que veio do Amapá.
“É um ato suprapartidário contra a violência, contra a intolerância, temos que demonstrar que apesar da violência não temos medo deles, estamos unidos num ato pela democracia”. O presidente nacional do PSol, Juliano Medeiros, discursou reafirmando que as diferenças na esquerda ainda existem mas que é necessária a unidade neste momento.
O senador Roberto Requião foi apresentado como a dissidência do MDB de Temer e foi aclamado pela população presente, que reagiu bradando “Volta Requião”, referindo-se ao mandato de governador do estado, que exerceu por três vezes.
Defensor do nacionalismo, Requião lembrou que a soberania do país estava assegurada e que o golpe parlamentar destituiu o governo para destruir a CLT, vender hidrelétricas, a privatização da saúde e da educação, “movimento instruído por interesses de países como os Estados Unidos”, situou.”A esperança de um povo não pode ser encarcerada”, disse.
A pré-candidata à presidência pelo Partido Comunista do Brasil, Manuela D’Ávila, se situou como uma entre muitos militantes de diversas organizações presentes no ato, que pensam diferentes formas de enfrentar o golpe.
Ela afirmou que o Brasil vive há dois anos sob governo golpista que está entregando o Brasil e que existe ativismo judicial para impedir que Lula concorra à presidência nas eleições de outubro. “Nós compreendemos que defender o direito de Lula ser candidato não e coisa de petista, mas tarefa de todos que defendem a democracia. Juntos venceremos o fascismo e o ódio”, convocou.
Guilherme Boulos, pré-candidato à presidência pelo Partido Socialismo e Liberdade, afirmou que o clima de ódio, de fascismo, de escalada da violência, foi que atirou em Marielle e que foi esse mesmo clima que atirou nos ônibus da caravana de Lula.
“E nós sabemos quem puxou o gatilho. Que não foi um indivíduo. Eles têm cara e tem nome. Temos que responsabilizar Jair Bolsonaro por isso”, declarou Boulos afirmando que a apologia à violência está plantando a semente do fascismo. O líder do MTST propôs a formação de uma frente unitária democrática de esquerda contra o fascismo.
Quando Lula assumiu o microfone, disse que as caravanas são realizadas para ouvir as pessoas. Ele então chamou Isabela, jovem do Quilombo Paiol de Telha, que iniciou sua fala reiterando o direito das mulheres, negras, de povos originários, terem seu lugar de fala respeitado. Falou sobre mulheres que sofrem violência doméstica, sobre mulheres negras, jovens negros, sobre balas que só acertam jovens nas favelas.
Ela reafirmou para Lula que é esse o povo que o defende: quilombolas, indígenas, trabalhadores, dos movimentos sociais. “E quando você tiver que negociar, lembre do povo que te defende. Se tem fascista, aqui também tem resistência”, Lula foi então convidado para a formatura da turma Nilce de Souza (Nicinha) do curso de direito que forma sem terras, quilombolas, atingidos por barragens.
O pré-candidato à presidência Lula assumiu então o ato suprapartidário enquanto ato partidário em defesa de sua candidatura pelo Partido dos Trabalhadores. Narrou desde Bagé (RS), até Laranjeiras do Sul (PR), todos os ataques e ofensivas que sua caravana pelo sul sofreu. E responsabilizou a Rede Globo de Televisão e a imprensa comercial hegemônica, de um modo geral, por fomentar o ódio e o fascismo.
“Falam mal de mim 60 horas no Jornal Nacional. Falam mal de mim em 70 capas de revistas. Em 500 capas de jornais. Mas eles não se conformam que quanto mais falando mal de mim, mais eu cresço nas pesquisas. Alguns até defendem os ataques à caravana. A imprensa foi conivente com isso”, declarou.
Lula resgatou melhoras na vida da população promovidas pelo seu governo, como os 20 milhões de emprego com carteira assinada, reajuste acima da inflação para todas as categorias organizadas, aumento do salário mínimo, a inclusão das domésticas como celetistas, com direito a férias e jornada estabelecida na carteira de trabalho, o que ele chamou de inserção como cidadã. Falou que foram os bancos públicos que salvaram a economia brasileira enquanto os outros países do mundo ruíam com a crise de 2008. Ele citou como marco das mudanças que desencadeou no golpe a descoberta do pré-sal e que o golpe coloca em risco a soberania nacional.
Ele também se defendeu da condenação na Justiça Federal e no TRF-4. “Eu não tenho nada contra a lava jato, eu tenho contra a mentira”. Ele reforçou em suas declarações que o Ministério Público Federal e a Justiça Federal têm que provar que ele cometeu crimes.
“Foram na minha casa e olharam embaixo do meu colchão, dentro do fogão, e não acharam nada. Mas foram na casa do Geddel e acharam”, lembrou Lula, referindo-se às malas de dinheiro encontradas num bunker. Ele reafirmou que o apartamento não está em seu nome, que ele não pagou, que sequer visitou. E criticou que até mesmo o futebol, que todo mundo aprecia, foi transformado em questão ideológica de ódio.
“Eles sabem que eu sei como consertar esse país. Vou convocar referendo revogatório e nova constituinte. Vou federalizar o ensino médio, vou isentar de imposto de renda para quem recebe até 5 salários mínimos. Eu não acredito que eu seja preso, porque pra ser preso tem que ter crime. Nós somos uma ideia e eles não conseguem prender ideias”.
Resistências do povo
Gleisson Robson é presidente da associação de moradores Madre Teresa de Calcutá, em Piraquara, maior projeto de regularização fundiária do país, segundo relatou, promovida durante o governo Lula no PAC 2. Ele veio apoiar Lula ao lado de outros moradores do local, que tem 3 mil famílias. Eles relataram aumento do desemprego, corte nos cursos técnicos e aumento na inadimplência do pagamento de água e luz como os principais problemas no bairro no período pós golpe.
Camila Lanes, da UJS, chamou a atenção para um dos prédios em frente à Praça, com diversas bandeiras verde e amarelas, dizendo que o pessoal estava hostilizando, jogando ovos. E mandou o recado: “de camarote não, a luta é aqui no chão”.
Andreia de Lima é moradora da favela do Parolin, em Curitiba e acompanha o ato representando e apoiando os que acreditam que o governo Lula foi o melhor para os mais pobres. O local onde ela mora passou por ao menos duas enchentes no mês de março. Ela afirma que houve a liberação de recursos pelo Minha Casa Minha Vida no governo Dilma, que o governo estadual de Beto Richa não teria desenvolvido. Ela também afirma que a limpeza pública deixou de existir desde que Greca assumiu a prefeitura em Curitiba.
Os músicos Flavio Renegado, Vato GB, João Bello e Janine Matias foram os responsáveis pelas atrações artísticas de resistência.
Robson Formica, do Movimento dos Atingidos por Barragens, acredita que a caravana retoma a esperança de superar esse momento de ódio no país. Para ele, Curitiba acolhe Lula pela coragem de percorrer o país por um governo popular para melhorar a vida dos mais pobres.
Anacélie Azevedo, diretora do Sindipetro, estava ao lado de diversos petroleiros em apoio à candidatura de Lula. Ela afirmou que a Petrobrás foi a empresa mais prejudicada pelo golpe e que Lula impulsionou o desenvolvimento do setor de petróleo no país. Ela acredita que Boulos e Manuela demonstraram entendimento do que a prisão de Lula pode significar contra a democracia.